Concepções de alfabetização e letramento
Na trajetória histórica do termo alfabetização, até os anos 80, os estudos e as pesquisas consideravam que para a criança aprender, ela dependeria apenas de estímulos externos que a levariam a dominar o sistema alfabético para, depois, ser capaz de ler e escrever.Dois métodos emergem desta concepção e caracterizam a alfabetização até os anos 80: o método baseado no princípio da síntese, no qual a alfabetização deve partir das unidades menores da língua – os fonemas, as sílabas, e logo a seguir unidades maiores – a palavra, a frase, o texto (método fônico, método silábico) e o método pelo princípio da análise, segundo o qual a alfabetização deve partir das unidades maiores e portadoras de sentido – a palavra, a frase, o texto – em direção às unidades menores (método da palavra, método da sentenciar, método global).
Estes métodos não consideravam o processo construtivo das crianças. De acordo com Soares (2004), estas duas formas metodológicas passaram a sofrer críticas severas nos anos 80, quando a perspectiva psicogenética da aprendizagem da língua escrita começa a ser divulgada no Brasil pela obra e pela atuação formativa de Emilia Ferreiro (1985), sob a denominação de construtivismo.
A partir dessa abordagem, ocorre uma mudança de pensamento em busca de novas concepções e metodologias eficazes para o processo de aprendizagem, ao eliminar a distinção entre aprendizagem do sistema de escrita e práticas efetivas de leitura e de escrita. Essa nova abordagem do fenômeno da alfabetização permite identificar e explicar o processo por meio do qual a criança constrói o conceito de língua escrita como um sistema de representação dos sons da fala por sinais gráficos, ou seja, o processo por meio do qual a criança torna-se alfabética.Além disso, sugere as condições em que mais adequadamente se desenvolva esse processo, revelando o papel fundamental de uma interação intensa e diversificada da criança com práticas e materiais reais de leitura e escrita, a fim de que ocorra o processo de conceptualização e entendimento da língua escrita. Entretanto, é necessário fazer a distinção entre aprendizagem do sistema de escrita e práticas efetivas de leitura e de escrita porque tanto em uma como noutra estão envolvidas diferentes dimensões da capacidade metalinguística: reflexão, análise e controle intencional; consciência fonológica, conhecimento das letras, consciência grafo-fonêmica e pragmática; mediação do adulto ou de outra criança mais velha que fornecem a ela informações ou que provocam sua reflexão.
Enfim, é preciso ter o domínio do sistema de escrita (conceito e reconhecimento das relações letra-som) para aprender a ler e escrever. A respeito da aquisição da linguagem escrita pela criança, Ferreiro, em colaboração com Teberosky (1985), desenvolveu pesquisas no México chegando à conclusão de que quando a criança ingressa na escola já possuí competência linguística, geralmente não considerada neste meio:
[…] atualmente sabemos que a criança que chega à escola tem um notável conhecimento de sua Língua Materna, um saber linguístico que utiliza ‘sem saber’ (inconscientemente) em seus atos de comunicação cotidianos. (FERREIRO; TEBEROSKY, 1985, p. 24).
Para estas pesquisadoras, este processo começa muito cedo, antes da entrada da criança na escola, e segue uma linha de evolução regular que ficou conhecida como Psicogênese da língua escrita (FERREIRO; TEBEROSKY, 1985).
Por meio deste estudo, os autores evidenciaram e explicaram o caminho percorrido pelas crianças para compreender o valor e as funções da escrita. Estes estudos contribuíram significativamente para a superação da visão da escrita alfabética concebida como transcrição fonética do idioma que se baseava na ideia de que a forma como a criança se apropria da linguagem oral servia como modelo para explicar a aquisição da linguagem escrita e era esse modelo que sustentava a maioria dos métodos usados para alfabetizar as crianças.
[…] muitas das práticas do ensino da língua escrita são tributárias do que se sabia da aquisição da linguagem oral; a progressão clássica que consiste em começar pelas vogais, seguidas de consoantes labiais com vogais, e a partir daí chegar à formação das primeiras palavras por duplicação dessas sílabas mamá, papá, e , quando se trata de orações, começar por orações declarativas simples, é uma série que reproduz bastante bem a série de aquisição da língua oral, tal como ela se apresenta vista do “lado de fora” (isto é, vista desde as condutas observáveis e não desde o processo que engendra essas condutas observáveis). Implicitamente, julgava-se ser necessário passar por essas mesmas etapas quando se trata de aprender a língua escrita, como se esta aprendizagem fosse uma aprendizagem da fala. (FERREIRO; TEBEROSKY, 1985, p. 23-24)
Contudo, para Ferreiro e Teberosky (1985), além da relação da escrita com o código oral, há uma relação da escrita com o mundo real. A escrita, nessa concepção, é um sistema simbólico de representação, e não um código de transcrição. Esta visão rompe com a concepção de um processo de aquisição da escrita apenas técnico para considerá-lo como um processo conceitual, no qual a criança é um sujeito ativo e com competência linguística.
Baseado nestas ideias, o construtivismo revelou processos de compreensão da escrita pela criança, que foram identificados a partir da análise de escritas espontâneas. Esses aspectos evidenciavam que a criança construía hipóteses sobre o funcionamento da língua escrita e, portanto, se mostrava imprescindível conhecer como ocorria esse processo de elaboração e de apropriação acerca do sistema de escrita alfabético.
De acordo com Soares (2004), o foco no processo de construção alfabético da língua escrita pela criança da ênfase na importância de sua interação com práticas de leitura e de escrita como meio para provocar e motivar o processo, na prática escolar da aprendizagem inicial da língua escrita, o ensino sistemático das relações entre a fala e a escrita de que se ocupa a alfabetização.
Para Soares (2004), houve grandes avanços teóricos sobre a aquisição da escrita que trouxeram mudanças significativas no modo de conceber a alfabetização. Neste sentido, atualmente, o que parece caracterizar a concepção de alfabetização é que esta não é mais compreendida como um processo que envolve apenas aprender a ler e a escrever enquanto habilidades de codificação e decodificação, mas implica também um processo de apropriação da linguagem escrita como prática social, respeitando o vocabulário que a criança já traz para dentro da escola. Entretanto, a apropriação dos conceitos de alfabetização e letramento que está no cerne dessa discussão, pelos professores alfabetizadores, ainda parece oscilar entre a noção de que o processo de apropriar-se da linguagem escrita signifique a mera aquisição de um sistema de codificação, para uns, e a apropriação de um sistema complexo de representação que implica inclusive a capacidade de ler e compreender o que foi lido, para outros. Com relação à noção de que o processo de apropriação da linguagem escrita signifique a mera aquisição de um sistema de codificação.
Smolka (1993) ressalta que as práticas docentes que consideram o professor como detentor do saber, com a função de ensinar a linguagem escrita, reduz o processo de aquisição desta linguagem ao ensino de uma técnica e a própria escrita é reduzida e apresentada como uma técnica. Para ela, as crianças que não conseguem aprender a ler e escrever são resultado deste equívoco, que desconsidera a participação da criança na construção deste conhecimento em função da necessidade de aprender o saber da escola.
Segundo Smolka (1993), o processo de alfabetização nos moldes tradicionais, nos quais a construção e aquisição da leitura e da escrita pela criança, acontece por meio de métodos convencionais, como a silabação e a palavração, por exemplo, é algo extremamente preocupante. Deste modo, a autora questiona os métodos tradicionais de alfabetização que limitam a compreensão da aquisição da leitura e da escrita como um ensino mecânico, sem significação real para as crianças. Segundo a autora, nessa concepção, as crianças são cobradas pelo que não entendem e são levadas a buscar estratégias para sobreviverem nesse sistema, no qual poucas crianças conseguem desenvolver naturalmente este entendimento.
O processo de elaboração mental da criança na construção do conhecimento sobre a escrita, que inicialmente passa pela linguagem falada, fica terrivelmente dificultado porque a escrita apresentada na escola é completamente distanciada da fala das crianças, e, na maioria das vezes, é o que não se pensa, o que não se fala. Ou seja, a “defasagem” não é apenas uma contingência da forma escrita de linguagem, mas é também produto das condições de ensino. (SMOLKA, 1993, p. 60).
Para Smolka (1993), a escrita é considerada mais que um instrumento técnico ou uma atividade mecânica; trata-se de um momento de interação e interlocução entre os sujeitos envolvidos neste processo. O processo inicial de leitura que passa pela escrita, o trabalho inicial da escrita que passa pela fala, revelam fragmentos e momentos do “discurso interior”, da “dialogia interna”, das crianças, nessa forma de interação verbal. O papel do “outro”, do mediador, nessa interação começa a se delinear (SMOLKA, 1993, p. 62).
De acordo com Soares (1999), ao mesmo tempo em que a criança apropria-se da escrita como forma de interlocução, como atividade discursiva, ela deve também ser conduzida a várias aprendizagens, ou seja, ela precisa aprender a distinguir o texto oral do texto escrito, a estruturar adequadamente seu texto escrito, a controlar as possibilidades de apreensão do sentido do texto pelo pretendido leitor, apropriar-se dos recursos de coesão próprios do texto escrito, aprender as convenções de organização do texto na página.
É necessário considerar as questões relativas à aquisição do sistema de escrita e as questões relativas à utilização desse sistema para a interação social, isto é, o desenvolvimento das habilidades textuais. Para Soares (1999), o problema enfrentado com relação à apropriação da leitura e da escrita é que, no contexto escolar, as questões da relação letra e som, ou das relações entre fala e escrita em consonância com o desenvolvimento das habilidades textuais, são sempre negligenciadas.
Para Smolka (1993), o problema é a distância entre ensinar a técnica da escrita e considerar as funções sociais da língua escrita. Para nós, a questão principal é compreender as crianças como um sujeito de direito, reconhecendo-as como produtoras de cultura. Isto implica compreender a aprendizagem da leitura e da escrita como práticas sociais que devem ser integradas às demais práticas sociais que se desenvolvem na infância. A necessidade de ampliar o conceito de alfabetização, para que a aprendizagem da leitura deixe de ser vista apenas como reconhecimento de letras, sílabas e palavras, e a escrita apenas como um código de transcrição da fala.
As pesquisas atuais sobre a apropriação da linguagem escrita pelas crianças e como ocorre este processo (Baptista, 2010; Baptista, 2013; Ferreiro, 1985; Soares, 2009; Kramer, 2006) evidenciam que existe uma forte relação entre esta apropriação e o próprio desenvolvimento Infantil.
Estes estudos permitem concluir que o processo de apropriação deve iniciar-se desde os primeiros anos de vida. Isto porque a criança, desde o seu nascimento, é um sujeito social que produz cultura e está inserida nela, uma cultura na qual a escrita está presente e determina, em grande medida, a dinâmica da sociedade. A escrita está presente na dinâmica da sociedade, assumindo diferentes funções, das quais as crianças, mesmo sem a intencionalidade do adulto, acabam participando. Estas funções são adquiridas pelas crianças, de acordo com Ferreiro (1993), por meio da sua participação em atos sociais, nos quais a língua escrita cumpre funções precisas. Considerando esta perspectiva, Smolka (1993) ressalta que a alfabetização, da forma como preconizou Vygotsky, pode ser compreendida como atividade discursiva interativa, instauradora e constituinte do conhecimento na e pela escrita. Para Smolka (1993), a alfabetização do ponto de vista da psicologia Vygotskiana pode englobar a questão da aquisição da linguagem oral e escrita enquanto processo de interação social.
Para Smolka (1993), a criança aprende de forma mais eficaz quando se envolve em atividades coletivas e lúdicas, que tenham significado para ela e quando orientada por alguém que tenha competência, ou seja, enfatizando o papel crucial do educador mediador. Isto porque o nosso comportamento é mediado por signos, respondendo a significados que atribuímos a situações cuja interpretação depende de um contexto cultural.
Concepções de alfabetização e letramento – Com relação aos aspectos
da apropriação da leitura e escrita pelas crianças, dois conceitos são
frequentemente discutidos nas abordagens relacionadas a esta
apropriação: a alfabetização e o letramento.
Dois métodos emergem desta concepção e caracterizam a alfabetização até os anos 80: o método baseado no princípio da síntese, no qual a alfabetização deve partir das unidades menores da língua – os fonemas, as sílabas, e logo a seguir unidades maiores – a palavra, a frase, o texto (método fônico, método silábico) e o método pelo princípio da análise, segundo o qual a alfabetização deve partir das unidades maiores e portadoras de sentido – a palavra, a frase, o texto – em direção às unidades menores (método da palavra, método da sentenciar, método global).
Estes métodos não consideravam o processo construtivo das crianças. De acordo com Soares (2004), estas duas formas metodológicas passaram a sofrer críticas severas nos anos 80, quando a perspectiva psicogenética da aprendizagem da língua escrita começa a ser divulgada no Brasil pela obra e pela atuação formativa de Emilia Ferreiro (1985), sob a denominação de construtivismo.
A partir dessa abordagem, ocorre uma mudança de pensamento em busca de novas concepções e metodologias eficazes para o processo de aprendizagem, ao eliminar a distinção entre aprendizagem do sistema de escrita e práticas efetivas de leitura e de escrita. Essa nova abordagem do fenômeno da alfabetização permite identificar e explicar o processo por meio do qual a criança constrói o conceito de língua escrita como um sistema de representação dos sons da fala por sinais gráficos, ou seja, o processo por meio do qual a criança torna-se alfabética.Além disso, sugere as condições em que mais adequadamente se desenvolva esse processo, revelando o papel fundamental de uma interação intensa e diversificada da criança com práticas e materiais reais de leitura e escrita, a fim de que ocorra o processo de conceptualização e entendimento da língua escrita. Entretanto, é necessário fazer a distinção entre aprendizagem do sistema de escrita e práticas efetivas de leitura e de escrita porque tanto em uma como noutra estão envolvidas diferentes dimensões da capacidade metalinguística: reflexão, análise e controle intencional; consciência fonológica, conhecimento das letras, consciência grafo-fonêmica e pragmática; mediação do adulto ou de outra criança mais velha que fornecem a ela informações ou que provocam sua reflexão.
Enfim, é preciso ter o domínio do sistema de escrita (conceito e reconhecimento das relações letra-som) para aprender a ler e escrever. A respeito da aquisição da linguagem escrita pela criança, Ferreiro, em colaboração com Teberosky (1985), desenvolveu pesquisas no México chegando à conclusão de que quando a criança ingressa na escola já possuí competência linguística, geralmente não considerada neste meio:
[…] atualmente sabemos que a criança que chega à escola tem um notável conhecimento de sua Língua Materna, um saber linguístico que utiliza ‘sem saber’ (inconscientemente) em seus atos de comunicação cotidianos. (FERREIRO; TEBEROSKY, 1985, p. 24).
Para estas pesquisadoras, este processo começa muito cedo, antes da entrada da criança na escola, e segue uma linha de evolução regular que ficou conhecida como Psicogênese da língua escrita (FERREIRO; TEBEROSKY, 1985).
Por meio deste estudo, os autores evidenciaram e explicaram o caminho percorrido pelas crianças para compreender o valor e as funções da escrita. Estes estudos contribuíram significativamente para a superação da visão da escrita alfabética concebida como transcrição fonética do idioma que se baseava na ideia de que a forma como a criança se apropria da linguagem oral servia como modelo para explicar a aquisição da linguagem escrita e era esse modelo que sustentava a maioria dos métodos usados para alfabetizar as crianças.
[…] muitas das práticas do ensino da língua escrita são tributárias do que se sabia da aquisição da linguagem oral; a progressão clássica que consiste em começar pelas vogais, seguidas de consoantes labiais com vogais, e a partir daí chegar à formação das primeiras palavras por duplicação dessas sílabas mamá, papá, e , quando se trata de orações, começar por orações declarativas simples, é uma série que reproduz bastante bem a série de aquisição da língua oral, tal como ela se apresenta vista do “lado de fora” (isto é, vista desde as condutas observáveis e não desde o processo que engendra essas condutas observáveis). Implicitamente, julgava-se ser necessário passar por essas mesmas etapas quando se trata de aprender a língua escrita, como se esta aprendizagem fosse uma aprendizagem da fala. (FERREIRO; TEBEROSKY, 1985, p. 23-24)
Contudo, para Ferreiro e Teberosky (1985), além da relação da escrita com o código oral, há uma relação da escrita com o mundo real. A escrita, nessa concepção, é um sistema simbólico de representação, e não um código de transcrição. Esta visão rompe com a concepção de um processo de aquisição da escrita apenas técnico para considerá-lo como um processo conceitual, no qual a criança é um sujeito ativo e com competência linguística.
Baseado nestas ideias, o construtivismo revelou processos de compreensão da escrita pela criança, que foram identificados a partir da análise de escritas espontâneas. Esses aspectos evidenciavam que a criança construía hipóteses sobre o funcionamento da língua escrita e, portanto, se mostrava imprescindível conhecer como ocorria esse processo de elaboração e de apropriação acerca do sistema de escrita alfabético.
De acordo com Soares (2004), o foco no processo de construção alfabético da língua escrita pela criança da ênfase na importância de sua interação com práticas de leitura e de escrita como meio para provocar e motivar o processo, na prática escolar da aprendizagem inicial da língua escrita, o ensino sistemático das relações entre a fala e a escrita de que se ocupa a alfabetização.
Para Soares (2004), houve grandes avanços teóricos sobre a aquisição da escrita que trouxeram mudanças significativas no modo de conceber a alfabetização. Neste sentido, atualmente, o que parece caracterizar a concepção de alfabetização é que esta não é mais compreendida como um processo que envolve apenas aprender a ler e a escrever enquanto habilidades de codificação e decodificação, mas implica também um processo de apropriação da linguagem escrita como prática social, respeitando o vocabulário que a criança já traz para dentro da escola. Entretanto, a apropriação dos conceitos de alfabetização e letramento que está no cerne dessa discussão, pelos professores alfabetizadores, ainda parece oscilar entre a noção de que o processo de apropriar-se da linguagem escrita signifique a mera aquisição de um sistema de codificação, para uns, e a apropriação de um sistema complexo de representação que implica inclusive a capacidade de ler e compreender o que foi lido, para outros. Com relação à noção de que o processo de apropriação da linguagem escrita signifique a mera aquisição de um sistema de codificação.
Smolka (1993) ressalta que as práticas docentes que consideram o professor como detentor do saber, com a função de ensinar a linguagem escrita, reduz o processo de aquisição desta linguagem ao ensino de uma técnica e a própria escrita é reduzida e apresentada como uma técnica. Para ela, as crianças que não conseguem aprender a ler e escrever são resultado deste equívoco, que desconsidera a participação da criança na construção deste conhecimento em função da necessidade de aprender o saber da escola.
Segundo Smolka (1993), o processo de alfabetização nos moldes tradicionais, nos quais a construção e aquisição da leitura e da escrita pela criança, acontece por meio de métodos convencionais, como a silabação e a palavração, por exemplo, é algo extremamente preocupante. Deste modo, a autora questiona os métodos tradicionais de alfabetização que limitam a compreensão da aquisição da leitura e da escrita como um ensino mecânico, sem significação real para as crianças. Segundo a autora, nessa concepção, as crianças são cobradas pelo que não entendem e são levadas a buscar estratégias para sobreviverem nesse sistema, no qual poucas crianças conseguem desenvolver naturalmente este entendimento.
O processo de elaboração mental da criança na construção do conhecimento sobre a escrita, que inicialmente passa pela linguagem falada, fica terrivelmente dificultado porque a escrita apresentada na escola é completamente distanciada da fala das crianças, e, na maioria das vezes, é o que não se pensa, o que não se fala. Ou seja, a “defasagem” não é apenas uma contingência da forma escrita de linguagem, mas é também produto das condições de ensino. (SMOLKA, 1993, p. 60).
Para Smolka (1993), a escrita é considerada mais que um instrumento técnico ou uma atividade mecânica; trata-se de um momento de interação e interlocução entre os sujeitos envolvidos neste processo. O processo inicial de leitura que passa pela escrita, o trabalho inicial da escrita que passa pela fala, revelam fragmentos e momentos do “discurso interior”, da “dialogia interna”, das crianças, nessa forma de interação verbal. O papel do “outro”, do mediador, nessa interação começa a se delinear (SMOLKA, 1993, p. 62).
De acordo com Soares (1999), ao mesmo tempo em que a criança apropria-se da escrita como forma de interlocução, como atividade discursiva, ela deve também ser conduzida a várias aprendizagens, ou seja, ela precisa aprender a distinguir o texto oral do texto escrito, a estruturar adequadamente seu texto escrito, a controlar as possibilidades de apreensão do sentido do texto pelo pretendido leitor, apropriar-se dos recursos de coesão próprios do texto escrito, aprender as convenções de organização do texto na página.
É necessário considerar as questões relativas à aquisição do sistema de escrita e as questões relativas à utilização desse sistema para a interação social, isto é, o desenvolvimento das habilidades textuais. Para Soares (1999), o problema enfrentado com relação à apropriação da leitura e da escrita é que, no contexto escolar, as questões da relação letra e som, ou das relações entre fala e escrita em consonância com o desenvolvimento das habilidades textuais, são sempre negligenciadas.
Para Smolka (1993), o problema é a distância entre ensinar a técnica da escrita e considerar as funções sociais da língua escrita. Para nós, a questão principal é compreender as crianças como um sujeito de direito, reconhecendo-as como produtoras de cultura. Isto implica compreender a aprendizagem da leitura e da escrita como práticas sociais que devem ser integradas às demais práticas sociais que se desenvolvem na infância. A necessidade de ampliar o conceito de alfabetização, para que a aprendizagem da leitura deixe de ser vista apenas como reconhecimento de letras, sílabas e palavras, e a escrita apenas como um código de transcrição da fala.
As pesquisas atuais sobre a apropriação da linguagem escrita pelas crianças e como ocorre este processo (Baptista, 2010; Baptista, 2013; Ferreiro, 1985; Soares, 2009; Kramer, 2006) evidenciam que existe uma forte relação entre esta apropriação e o próprio desenvolvimento Infantil.
Estes estudos permitem concluir que o processo de apropriação deve iniciar-se desde os primeiros anos de vida. Isto porque a criança, desde o seu nascimento, é um sujeito social que produz cultura e está inserida nela, uma cultura na qual a escrita está presente e determina, em grande medida, a dinâmica da sociedade. A escrita está presente na dinâmica da sociedade, assumindo diferentes funções, das quais as crianças, mesmo sem a intencionalidade do adulto, acabam participando. Estas funções são adquiridas pelas crianças, de acordo com Ferreiro (1993), por meio da sua participação em atos sociais, nos quais a língua escrita cumpre funções precisas. Considerando esta perspectiva, Smolka (1993) ressalta que a alfabetização, da forma como preconizou Vygotsky, pode ser compreendida como atividade discursiva interativa, instauradora e constituinte do conhecimento na e pela escrita. Para Smolka (1993), a alfabetização do ponto de vista da psicologia Vygotskiana pode englobar a questão da aquisição da linguagem oral e escrita enquanto processo de interação social.
Para Smolka (1993), a criança aprende de forma mais eficaz quando se envolve em atividades coletivas e lúdicas, que tenham significado para ela e quando orientada por alguém que tenha competência, ou seja, enfatizando o papel crucial do educador mediador. Isto porque o nosso comportamento é mediado por signos, respondendo a significados que atribuímos a situações cuja interpretação depende de um contexto cultural.
Concepções de alfabetização e letramento
Na trajetória histórica do termo alfabetização, até os anos 80, os estudos e as pesquisas consideravam que para a criança aprender, ela dependeria apenas de estímulos externos que a levariam a dominar o sistema alfabético para, depois, ser capaz de ler e escrever.Dois métodos emergem desta concepção e caracterizam a alfabetização até os anos 80: o método baseado no princípio da síntese, no qual a alfabetização deve partir das unidades menores da língua – os fonemas, as sílabas, e logo a seguir unidades maiores – a palavra, a frase, o texto (método fônico, método silábico) e o método pelo princípio da análise, segundo o qual a alfabetização deve partir das unidades maiores e portadoras de sentido – a palavra, a frase, o texto – em direção às unidades menores (método da palavra, método da sentenciar, método global).
Estes métodos não consideravam o processo construtivo das crianças. De acordo com Soares (2004), estas duas formas metodológicas passaram a sofrer críticas severas nos anos 80, quando a perspectiva psicogenética da aprendizagem da língua escrita começa a ser divulgada no Brasil pela obra e pela atuação formativa de Emilia Ferreiro (1985), sob a denominação de construtivismo.
A partir dessa abordagem, ocorre uma mudança de pensamento em busca de novas concepções e metodologias eficazes para o processo de aprendizagem, ao eliminar a distinção entre aprendizagem do sistema de escrita e práticas efetivas de leitura e de escrita. Essa nova abordagem do fenômeno da alfabetização permite identificar e explicar o processo por meio do qual a criança constrói o conceito de língua escrita como um sistema de representação dos sons da fala por sinais gráficos, ou seja, o processo por meio do qual a criança torna-se alfabética.Além disso, sugere as condições em que mais adequadamente se desenvolva esse processo, revelando o papel fundamental de uma interação intensa e diversificada da criança com práticas e materiais reais de leitura e escrita, a fim de que ocorra o processo de conceptualização e entendimento da língua escrita. Entretanto, é necessário fazer a distinção entre aprendizagem do sistema de escrita e práticas efetivas de leitura e de escrita porque tanto em uma como noutra estão envolvidas diferentes dimensões da capacidade metalinguística: reflexão, análise e controle intencional; consciência fonológica, conhecimento das letras, consciência grafo-fonêmica e pragmática; mediação do adulto ou de outra criança mais velha que fornecem a ela informações ou que provocam sua reflexão.
Enfim, é preciso ter o domínio do sistema de escrita (conceito e reconhecimento das relações letra-som) para aprender a ler e escrever. A respeito da aquisição da linguagem escrita pela criança, Ferreiro, em colaboração com Teberosky (1985), desenvolveu pesquisas no México chegando à conclusão de que quando a criança ingressa na escola já possuí competência linguística, geralmente não considerada neste meio:
[…] atualmente sabemos que a criança que chega à escola tem um notável conhecimento de sua Língua Materna, um saber linguístico que utiliza ‘sem saber’ (inconscientemente) em seus atos de comunicação cotidianos. (FERREIRO; TEBEROSKY, 1985, p. 24).
Para estas pesquisadoras, este processo começa muito cedo, antes da entrada da criança na escola, e segue uma linha de evolução regular que ficou conhecida como Psicogênese da língua escrita (FERREIRO; TEBEROSKY, 1985).
Por meio deste estudo, os autores evidenciaram e explicaram o caminho percorrido pelas crianças para compreender o valor e as funções da escrita. Estes estudos contribuíram significativamente para a superação da visão da escrita alfabética concebida como transcrição fonética do idioma que se baseava na ideia de que a forma como a criança se apropria da linguagem oral servia como modelo para explicar a aquisição da linguagem escrita e era esse modelo que sustentava a maioria dos métodos usados para alfabetizar as crianças.
[…] muitas das práticas do ensino da língua escrita são tributárias do que se sabia da aquisição da linguagem oral; a progressão clássica que consiste em começar pelas vogais, seguidas de consoantes labiais com vogais, e a partir daí chegar à formação das primeiras palavras por duplicação dessas sílabas mamá, papá, e , quando se trata de orações, começar por orações declarativas simples, é uma série que reproduz bastante bem a série de aquisição da língua oral, tal como ela se apresenta vista do “lado de fora” (isto é, vista desde as condutas observáveis e não desde o processo que engendra essas condutas observáveis). Implicitamente, julgava-se ser necessário passar por essas mesmas etapas quando se trata de aprender a língua escrita, como se esta aprendizagem fosse uma aprendizagem da fala. (FERREIRO; TEBEROSKY, 1985, p. 23-24)
Contudo, para Ferreiro e Teberosky (1985), além da relação da escrita com o código oral, há uma relação da escrita com o mundo real. A escrita, nessa concepção, é um sistema simbólico de representação, e não um código de transcrição. Esta visão rompe com a concepção de um processo de aquisição da escrita apenas técnico para considerá-lo como um processo conceitual, no qual a criança é um sujeito ativo e com competência linguística.
Baseado nestas ideias, o construtivismo revelou processos de compreensão da escrita pela criança, que foram identificados a partir da análise de escritas espontâneas. Esses aspectos evidenciavam que a criança construía hipóteses sobre o funcionamento da língua escrita e, portanto, se mostrava imprescindível conhecer como ocorria esse processo de elaboração e de apropriação acerca do sistema de escrita alfabético.
De acordo com Soares (2004), o foco no processo de construção alfabético da língua escrita pela criança da ênfase na importância de sua interação com práticas de leitura e de escrita como meio para provocar e motivar o processo, na prática escolar da aprendizagem inicial da língua escrita, o ensino sistemático das relações entre a fala e a escrita de que se ocupa a alfabetização.
Para Soares (2004), houve grandes avanços teóricos sobre a aquisição da escrita que trouxeram mudanças significativas no modo de conceber a alfabetização. Neste sentido, atualmente, o que parece caracterizar a concepção de alfabetização é que esta não é mais compreendida como um processo que envolve apenas aprender a ler e a escrever enquanto habilidades de codificação e decodificação, mas implica também um processo de apropriação da linguagem escrita como prática social, respeitando o vocabulário que a criança já traz para dentro da escola. Entretanto, a apropriação dos conceitos de alfabetização e letramento que está no cerne dessa discussão, pelos professores alfabetizadores, ainda parece oscilar entre a noção de que o processo de apropriar-se da linguagem escrita signifique a mera aquisição de um sistema de codificação, para uns, e a apropriação de um sistema complexo de representação que implica inclusive a capacidade de ler e compreender o que foi lido, para outros. Com relação à noção de que o processo de apropriação da linguagem escrita signifique a mera aquisição de um sistema de codificação.
Smolka (1993) ressalta que as práticas docentes que consideram o professor como detentor do saber, com a função de ensinar a linguagem escrita, reduz o processo de aquisição desta linguagem ao ensino de uma técnica e a própria escrita é reduzida e apresentada como uma técnica. Para ela, as crianças que não conseguem aprender a ler e escrever são resultado deste equívoco, que desconsidera a participação da criança na construção deste conhecimento em função da necessidade de aprender o saber da escola.
Segundo Smolka (1993), o processo de alfabetização nos moldes tradicionais, nos quais a construção e aquisição da leitura e da escrita pela criança, acontece por meio de métodos convencionais, como a silabação e a palavração, por exemplo, é algo extremamente preocupante. Deste modo, a autora questiona os métodos tradicionais de alfabetização que limitam a compreensão da aquisição da leitura e da escrita como um ensino mecânico, sem significação real para as crianças. Segundo a autora, nessa concepção, as crianças são cobradas pelo que não entendem e são levadas a buscar estratégias para sobreviverem nesse sistema, no qual poucas crianças conseguem desenvolver naturalmente este entendimento.
O processo de elaboração mental da criança na construção do conhecimento sobre a escrita, que inicialmente passa pela linguagem falada, fica terrivelmente dificultado porque a escrita apresentada na escola é completamente distanciada da fala das crianças, e, na maioria das vezes, é o que não se pensa, o que não se fala. Ou seja, a “defasagem” não é apenas uma contingência da forma escrita de linguagem, mas é também produto das condições de ensino. (SMOLKA, 1993, p. 60).
Para Smolka (1993), a escrita é considerada mais que um instrumento técnico ou uma atividade mecânica; trata-se de um momento de interação e interlocução entre os sujeitos envolvidos neste processo. O processo inicial de leitura que passa pela escrita, o trabalho inicial da escrita que passa pela fala, revelam fragmentos e momentos do “discurso interior”, da “dialogia interna”, das crianças, nessa forma de interação verbal. O papel do “outro”, do mediador, nessa interação começa a se delinear (SMOLKA, 1993, p. 62).
De acordo com Soares (1999), ao mesmo tempo em que a criança apropria-se da escrita como forma de interlocução, como atividade discursiva, ela deve também ser conduzida a várias aprendizagens, ou seja, ela precisa aprender a distinguir o texto oral do texto escrito, a estruturar adequadamente seu texto escrito, a controlar as possibilidades de apreensão do sentido do texto pelo pretendido leitor, apropriar-se dos recursos de coesão próprios do texto escrito, aprender as convenções de organização do texto na página.
É necessário considerar as questões relativas à aquisição do sistema de escrita e as questões relativas à utilização desse sistema para a interação social, isto é, o desenvolvimento das habilidades textuais. Para Soares (1999), o problema enfrentado com relação à apropriação da leitura e da escrita é que, no contexto escolar, as questões da relação letra e som, ou das relações entre fala e escrita em consonância com o desenvolvimento das habilidades textuais, são sempre negligenciadas.
Para Smolka (1993), o problema é a distância entre ensinar a técnica da escrita e considerar as funções sociais da língua escrita. Para nós, a questão principal é compreender as crianças como um sujeito de direito, reconhecendo-as como produtoras de cultura. Isto implica compreender a aprendizagem da leitura e da escrita como práticas sociais que devem ser integradas às demais práticas sociais que se desenvolvem na infância. A necessidade de ampliar o conceito de alfabetização, para que a aprendizagem da leitura deixe de ser vista apenas como reconhecimento de letras, sílabas e palavras, e a escrita apenas como um código de transcrição da fala.
As pesquisas atuais sobre a apropriação da linguagem escrita pelas crianças e como ocorre este processo (Baptista, 2010; Baptista, 2013; Ferreiro, 1985; Soares, 2009; Kramer, 2006) evidenciam que existe uma forte relação entre esta apropriação e o próprio desenvolvimento Infantil.
Estes estudos permitem concluir que o processo de apropriação deve iniciar-se desde os primeiros anos de vida. Isto porque a criança, desde o seu nascimento, é um sujeito social que produz cultura e está inserida nela, uma cultura na qual a escrita está presente e determina, em grande medida, a dinâmica da sociedade. A escrita está presente na dinâmica da sociedade, assumindo diferentes funções, das quais as crianças, mesmo sem a intencionalidade do adulto, acabam participando. Estas funções são adquiridas pelas crianças, de acordo com Ferreiro (1993), por meio da sua participação em atos sociais, nos quais a língua escrita cumpre funções precisas. Considerando esta perspectiva, Smolka (1993) ressalta que a alfabetização, da forma como preconizou Vygotsky, pode ser compreendida como atividade discursiva interativa, instauradora e constituinte do conhecimento na e pela escrita. Para Smolka (1993), a alfabetização do ponto de vista da psicologia Vygotskiana pode englobar a questão da aquisição da linguagem oral e escrita enquanto processo de interação social.
Para Smolka (1993), a criança aprende de forma mais eficaz quando se envolve em atividades coletivas e lúdicas, que tenham significado para ela e quando orientada por alguém que tenha competência, ou seja, enfatizando o papel crucial do educador mediador. Isto porque o nosso comportamento é mediado por signos, respondendo a significados que atribuímos a situações cuja interpretação depende de um contexto cultural.
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